Veredas escritas poéticas com mulheres

Veredas

Veredas são caminhos, trajetórias, percurso, rumo, direção, sentido. O dicionário também apresenta que veredas podem ser como orientação de uma vida ou de uma ação. Veredas também podem ser, na região de Caatinga do país, planícies entre montes e montanhas em que a água represada promove fertilidade e presença de abundante vegetação.

Veredas, portanto, representam movimento de vida.

Em 2018, Veredas com Mulheres foi um grupo de encontros permanentes que se fez no espaço do consultório, para acolher e cuidar com mulheres, e caminhar, percorrer, inventar caminho. A pandemia (pela qual ainda passamos) afastou a possibilidade dos encontros presenciais, dos toques, dos abraços. Vivi luto por isso.

Na ideia de seguir percorrendo, caminhando, fazendo lugar de andanças, penso, hoje, outras possibilidades de seguir nos encontros com mulheres, de forma não presencial.

Mas…Como?

O Veredas com Mulheres do consultório segue suspenso, mas o lugar dele está lá, diferente, mais bonito, sendo cuidado até que possamos voltar a nos encontrar presencialmente. Ele não acabou, nem foi ou será substituído por outra coisa.

Nasce, pois, outra brecha para encontros com mulheres.

Encontros não presenciais com mulheres para ler, escrever e derramar poesia. Um lugar de encontro permanente, de relações de cuidado, resistências, existências.

Quem quiser criar junto…

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VEREDAS

⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ESCRITAS

⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀POÉTICAS

COM MULHERES

Escritas

Tenho um plano transgressor, rebelde e desobediente: vamos roubar a escrita pra nós?

A história da escrita não vem da evoluída sociedade europeia. Várias sociedades primitivas e arcaicas (África e Oriente Médio, ou Egito e Mesopotâmia) trazem em sua história a potência de registros escritos, de formas diversas, com finalidades tantas. — quem não me conhece bem, alerta de sacarmos na sentença anterior.

Não quero falar de história (nem poderia), mas trouxe um pouco disso para pensarmos o lugar que a escrita tem na nossa história, e a possibilidade de apropriação do ato de escrever como liberdade, arte, criatividade e vida.

A escrita, em nossa sociedade, começa com algo que nivela nossas crianças (com seis anos entra na escolinha, e o primeiro ano tem que ter escrita; b com a ba. c com a ca. etc). A escrita torna-se um mapeamento do desenvolvimento, pauta de reunião de pais, indicativo de inteligência – “nossa, como é inteligente essa criança que aprendeu a escrever primeiro, antes dos colegas, antes da escola”, em oposição às crianças que têm outros ritmos, outras “inteligências”.

Diante disso, escrita começa a ser inserida como rótulo, e como dor para crianças “que aprendem no seu tempo” e não competem com as crianças que aprendem aos seis.

Mais tarde, a redação do ENEM nivela quem escreve bem e quem não escreve. “Enquadradamos” e enrijecemos a escrita para caber na prova, é o certo a se fazer.

No mercado de trabalho, escrita vira e-mail, bilhete, ofício. Na universidade, escrita pede por ABNT.

Perdemos a escrita para esse modelo educacional e social que vem na colonização, e permanece com novos modos de sermos colonizados.

E SE A GENTE ROUBASSE A ESCRITA PARA NÓS, poderíamos escrever com liberdade? Poderíamos usar emoção e molhar papel de lágrimas? Carolina Maria de Jesus roubou a escrita para ela, tomou de assalto, com forte ameaça às academias de letras. Um sacrilégio!

Quero me inspirar nela e roubar a escrita, distribuir por aí nas leituras e produções coletivas, dando a permissão de Carolina Maria para quem mais quiser escrever.

E se a escrita se tornasse lugar de encontro e cuidado?

Poéticas com mulheres

Audre Lorde afirma: “POESIA NÃO É UM LUXO”.

Na definição do dicionário do Google, poesia consiste em “composição em versos, composição poética de pequena extensão”. Para além do dicionário, poesia pode ser libertação, ou um devir criativo que parte-chega-volta-revolta na liberdade.

Quando era adolescente, eu escrevia minhas poesias nas capas das apostilas da escola, e ouvi de um colega que poesia era coisa de garotas. Aquilo me revoltou, na ocasião. Audre Lorde ajuda a pensar que, não pelo tom que o colega falou, mas, de certa forma, há algo verdadeiro aí.

“Para as mulheres, então, poesia não é um luxo. É uma necessidade vital da nossa existência. Ela cria o tipo de luz sob a qual baseamos nossas esperanças e nossos sonhos de sobrevivência e mudança, primeiro como linguagem, depois como ideia, e então como ação mais tangível. É da poesia que nos valemos para nomear o que ainda não tem nome, e que só então pode ser pensado (…)”. — Audre Lorde

Me encontrei com poesia antes de encontrar Audre Lorde, quando ainda era criança. Encontrei lugar para poesia na clínica também antes de conhecê-la. Mas foi ela que me ajudou a dar sentidos nos usos de poesias com mulheres.

A autora ainda diz que a poesia “não é apenas um sonho ou imaginação; ela é o esqueleto que estrutura nossa vida. Ela estabelece os alicerces para um futuro de mudanças, uma ponte que atravessa o medo que sentimos daquilo que nunca existiu” (Audre Lorde).

Poesia dá relevo aos aspectos negados, à ancestralidade, à rebeldia, e à potência de ser mulher que da mulher é tirada.

Referências:

LORDE, Audre. Irmã outsider.

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